O
existencialismo surgiu numa Europa dilacerada por interesses antagônicos,
onde o homem se sentia ameaçado em sua individualidade e em sua realidade
concreta. Daí sua ênfase na solidão do indivíduo, na impossibilidade
de encontrar a verdade por meio de uma decisão intelectual e no caráter
irremediavelmente pessoal e subjetivo da vida humana. Denomina-se existencialismo
uma série de doutrinas filosóficas que, mesmo diferindo radicalmente
em muitos pontos, coincidem na idéia de que é a existência do ser humano,
como ser livre, que define sua essência, e não a essência ou natureza
humana que determina sua existência.
Existencialismo na filosofia
Embora represente uma corrente específica do pensamento
moderno, o existencialismo não deixa de ser uma tendência que se faz
sentir ao longo de toda a história da filosofia. Assim sucede, por exemplo,
com o imperativo socrático "conhece-te a ti mesmo"; com a angustiada
exclamação de Pascal, situando o homem entre o ser e o nada; ou com
a formulação do idealista alemão Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling,
segundo o qual a existência humana não pode ser reduzida à razão. Se
Hegel abraça o conceito da necessidade incoercível, afirmando que a
liberdade é a consciência da necessidade, o dinamarquês Søren Kierkegaard,
profundamente religioso e considerado o pai do existencialismo, interpreta
a existência em termos de possibilidade. A existência humana é, para
todas as formas de existencialismo, a projeção do futuro sobre a base
das possibilidades que o constituem. Para alguns pensadores dessa corrente
- os alemães Martin Heidegger e Karl Jaspers, por exemplo
- as possibilidades existenciais, na medida em que ancoradas no passado,
conduzem todo projeto de futuro para o passado. Para outros, como o
francês Jean-Paul Sartre, as possibilidades de escolha existencial
são infinitas e equivalentes, e a opção entre elas é, pois, indiferente.
Outros, enfim, como o italiano Nicola Abbagnano e o francês Maurice
Merleau-Ponty, consideram que as possibilidades existenciais são
limitadas pelas circunstâncias, mas nem determinam a escolha nem fazem
com que ela seja indiferente. Sejam quais forem suas posições particulares,
todos os existencialistas afirmam, porém, que a escolha entre as diferentes
possibilidades implica riscos, renúncia e limitação, salvo o francês
Gabriel Marcel, principal representante do existencialismo cristão,
que acha possível a transcendência do homem mediante seu encontro com
Deus na fé.
Traços fundamentais do existencialismo
Embora não seja possível dar uma definição precisa do existencialismo
- pois não existe um existencialismo único - ainda assim há uma série
de traços que ajudam a descrever a índole e o espírito desse movimento
filosófico.
O existencialismo introduz a experiência pessoal na reflexão
filosófica. Opondo-se à tradição de que o filósofo deve manter certa
distância entre ele próprio, como sujeito pensante, e o objeto que examina,
o existencialista submerge apaixonadamente no objeto que contempla,
a ponto de tornar sua filosofia basicamente autobiográfica (Kierkegaard).
Os temas de reflexão do existencialista giram em torno do homem e da
realidade humana (homem, liberdade, realidade individual, existência
cotidiana).
Heidegger, ao que parece, é o filósofo mais alheio a essa perspectiva,
pois para ele o problema fundamental da filosofia é o ontológico, isto
é, o problema do ser e, assim, o problema do homem fica subordinado
a esse problema. Ao descrever o existente que é o homem, Heidegger observa
que sua essência consiste em existir, pois esta é a determinação fundamental
do que ele chama Dasein (das in-der-Welt-Sein, "o estar-no-mundo").
O homem não é para os existencialistas um mero objeto. É um sujeito-no-mundo
e aberto para este.
Em termos sartrianos, o homem cria a si mesmo. A liberdade
é também um tema básico para os existencialistas. Mas esta não é para
eles uma liberdade acadêmica, como pressuposto do ato moral, mas sim
a liberdade que permite a escolha e, portanto, a realização do indivíduo.
Na Europa oprimida pelo nazismo e pelas ditaduras totalitárias, o existencialismo
significou a reafirmação da liberdade política e cultural do indivíduo.
Historicamente milita a favor do existencialismo a dura batalha que
travou contra a ditadura da razão formalizada, já antes denunciada por
Max Weber.
Tema impossível de ser posto de lado, a morte é também objeto
de atenção para os existencialistas. O homem vive para morrer; cada
um morre só. Para Heidegger, a morte é a última possibilidade do homem;
para Sartre, o fim de todas as possibilidades; para todos os existencialistas,
a suprema realidade transcendente. O ser-para-a-morte é o verdadeiro
destino e objetivo da existência humana. O tempo transcorre unicamente
entre o nascimento e a morte; é a experiência que o indivíduo tem de
sua limitação, de sua finitude. Assim, seria uma extrapolação arbitrária
representar o tempo que precede o começo da existência e continua correndo
depois que esta acabou. A consciência é sempre consciência de alguma
coisa. O dado básico do eu é a intencionalidade da consciência. A consciência
é do mundo, mas não se acha no mundo como as coisas. Se a consciência
é consciência de algo, ela própria não pode ser esse algo. É inerente
à consciência a negação da identidade entre consciência e algo. A consciência
se aproxima do ser, pois é consciência dele, mas se reconhece ao mesmo
tempo distanciada do ser. À distância entre o ser e a consciência Sartre
chama "nada".
Sartre: "..o homem, sem qualquer apoio e sem qualquer auxílio,
está condenado a cada instante a inventar o homem."
|